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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Relatório desmente versão da Polícia sobre Cafunfo e avança com 23 mortes

Luanda - Os deputados da UNITA, CASA-CE e PRS garantem que pelo menos 23 pessoas foram mortas, 21 ficaram feridas e 10 estão desaparecidas, na sequência dos confrontos registados no dia 30 de Janeiro na vila de Cafunfo, na província angolana da Lunda Norte.

Fonte: VOA

Em conferência de imprensa na terça-feira, 9, em Luanda, onde apresentaram um relatório sobre os incidentes, os líderes dos grupos parlamentares daqueles partidos na oposição disseram que “não houve qualquer tentativa de se assaltar uma esquadra” em Cafunfo, como disseram as autoridades.

“Essa acção (assalto à esquadra) nunca existiu”, afirmou Benedito Daniel, do PRS, para quem foi “um facto teórico que habilidosamente foi criado”.


Os moradores apenas “tentavam realizar uma manifestação pacífica, previamente comunicada às autoridades”, que não permitiram a sua realização, tendo ameaçado, dias antes, que "iriam disparar contra quem saísse à rua”, segundo Daniel.

Dos contactos mantidos, o líder do PRS afirmou que os manifestantes os “manifestantes, aglomerados para iniciar a marcha, foram surpreendidos por efetivos da polícia e das FAA que surgiram e começaram a disparar indiscriminadamente”.


Na mesma ocasião, Liberty Chiyaka, presidente do grupo parlamentar da UNITA, lembrou que a maioria dos angolanos vive "na indigência" e afirmou que quando um Governo não tem condições de honrar com os seus compromissos "deve pautar pela autodemissão".

Ele exortou os angolanos "a exigir a satisfação das suas necessidades e o cumprimento das promessas eleitorais".

Alexandre Sebastião André, líder da CASA-CE na Assembleia Nacional, pediu a responsabilização por este "drama", que "mancha o Estado democrático e de Direito e a Constituição que proíbe a pena de morte.


“Estamos diante de uma contradição incomensurável”, afirmou Sebastião André, quem criticou a detenção de deputados da UNITA à entrada de Cafunfo, quando queriam inteirar-se da situação.

As autoridades classificaram a marcha uma tentativa de assalto à esquadra de Cafunfo e justificaram a reacção das forças de segurança, como de protecção do Estado ante uma "rebelião".

A Polícia Nacional falou em seis mortes, enquanto a Amnistia Internacional confirmou a existência de 10 mortos e muito desaparecidos.

Além de prisões por contabilizar, o Serviço de Investigação Criminal deteve em Luanda o líder do Movimento do Protectorado Lunda Tchokwe, José Mateus Zecamutchima, que convocou a manifestação.

Ele é acusado de associação de malfeitores e rebelião.

 

RELATÓRIO SOBRE O MASSACRE DO CAFUNFO

Face aos trágicos acontecimentos do dia 30 de Janeiro de 2021, na Vila do Cafunfo, Município do Cuango, Província da Lunda-Norte que violam de forma grosseira a Constituição da República de Angola nos seus artigos 47º que consagra o direito de liberdade, de reunião e de manifestação, 30º que estabelece o direito à vida e o 59º, respectivamente, que consagra a proibição da pena de morte; acrescentado aos princípios fundantes dos valores da UNITA baseados no respeito à vida, à solidariedade e a defesa dos menos equipados, uma delegação composta por 5 Deputados do Grupo Parlamentar da UNITA nomeadamente: Alberto Ngalanela, Joaquim Nafoia, Sediangani Mbimbi, Domingos Oliveira, Rebeca Muaca e os activistas Laura Macedo e Domingos Cardoso deslocou-se à Vila do Cafunfo no dia 02 de Fevereiro de 2021, com o objectivo de constatar “in loco” os referidos acontecimentos.


Chegados à sede Municipal do Cuango, os Deputados solicitaram um encontro para cumprimentos de cortesia aos senhores Administrador Municipal e Comandante da Polícia Nacional, respectivamente, o que foi literalmente rejeitado por alegadas ordens superiores.


No seguimento da missão, a delegação foi interpelada e colocada sob custódia da Polícia de Intervenção Rápida (PIR), já instruída sob ordens superiores numa mata fechada à 5 km da Vila do Cafunfo, isto é, quando eram 12h48 do mesmo dia.


Entretanto, para a efectivação da detenção, a delegação foi conduzida até a cancela do controlo da Sociedade Mineira do Cuango localizada à 5 Km da referida Vila, de onde permaneceu 3 dias sob custódia, como se de criminosos se tratassem, no qual foi destacado um efectivo de mais de 35 elementos da Polícia de Intervenção Rápida (PIR) e Forças Armadas Angolanas (FAA) altamente armados e com exercícios permanentes de coacção e tortura psicológica.


Durante a custódia, os Deputados, os activistas e o seu grupo de apoio, foram proibidos de receber alimentação e água potável. Os Deputados foram submetidos a condições desumanas e inimagináveis para um estado democrático e de direito.

Das Constatações

Apesar do cárcere ilegal, abusivo e grosseiro de todos os membros da delegação, a sociedade local, a igreja, as famílias das vítimas e os agentes dos órgãos de defesa e segurança patriotas, tudo fizeram, mas absolutamente tudo, para nos fazer chegar a sua solidariedade e dados importantes sobre a ocorrência do dia 30 de Janeiro.


A inexistência de uma vida condigna para os jovens faz com que até pessoas mais velhas como os antigos trabalhadores da Diamang e Endiama, abandonados a sua sorte depois de verem terminados os seus contratos laborais, reivindiquem. A falta de pagamento das suas reformas, agudiza o seu sofrimento e das suas famílias.


1. Quem são os manifestantes? Os manifestantes são cidadãos angolanos maioritariamente ex-trabalhadores da Diamang e posteriormente ENDIAMA, cujas idades vão dos sessenta (60) anos de idade em diante que se sentem injustiçados e excluídos do sistema de compensação social, “vulgo”, Caixa de Segurança Social a que tinham direito por prestação durante o tempo de trabalho e jovens com os sonhos coarctados, que vivem em situação de indigência:


a) Aquele grupo de cidadãos e suas famílias relegados a condição de indigência muitos deles contribuíram para o surgimento de muitas vilas e cidades do leste do país e não só;

b) Aquele grupo de cidadãos reivindicam a falta de hospitais com medicamentos e todas condições para o tratamento deles e das comunidades. Ademais, manifestam a indignação pelo facto de a sua ENDIAMA ter construído clínicas denominadas “Sagrada Esperança”quase em todo o país, excepto nas Lundas Norte e Sul e, porque não no Moxico!


c) Aquele grupo de cidadãos viu-se impelido a reivindicar manifestando-se para exigir a satisfação das suas necessidades e expectativas frustradas. Eles reclamam também, da falta de escolas para a formação académica e profissional para os seus filhos e netos;


2. O problema principal que leva aquele grupo de cidadãos, particularmente jovens aderir ao movimento reivindicativo é de injustiça social e extrema pobreza naquela região do País. A pressão social é enorme pois não existe nas Províncias da Lunda Sul e Norte instituições sociais com vocação de acolher cidadãos carenciados particularmente idosos.


3. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou e constatou que na impossibilidade de não encontrar o emprego, a maioria da população activa com o destaque a juventude, dedica-se ao abate de árvores e a queima de carvão, o que pressupõe desde já consequências nefastas ao ecossistema;


4. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que a manifestação reivindicativa dos cidadãos foi comunicada à administração municipal com alguma antecedência e o seu objecto era pacífico tal como atesta o ofício resposta nº04/SG/2021 de 14 de Janeiro de 2021, da Administração Municipal do Cuango. De realçar que a referida carta solicitava protecção da Polícia Nacional durante e depois da manifestação;


5. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que a manifestação teve início as 5h30 da manhã do dia 30 de Janeiro de 2021, e não as 4h00 da madrugada como alegaram as autoridades locais. De salientar que do ponto de vista de fusos horários, no leste do país o dia nasce mais cedo do que no resto do território nacional, ou seja, 5h30 lá é hora do início de trabalho;


6. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que o número de manifestantes foi apenas de 93 cidadãos no total e não de 300 pessoas como alegaram as autoridades. O número reduzido de cidadãos que pretendiam manifestar, deveu-se a atitude das autoridades que um dia antes, isto é, no dia 29 de Janeiro procederam à buscas e detenções de dezasseis (16) membros da organização que vieram a ser apresentados como insurgentes.


7. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que durante o desfile, os manifestantes entoavam cânticos com o seguinte teor:“a Lunda é nossa, deixem-nos em paz” e o guia da manifestação empunhava uma catana (a única), que alegaram como símbolo de resistência e bravura a exemplo de 4 de Fevereiro de 1961;


8. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que da parte dos manifestantes, não havia a mínima intenção de atacar a esquadra da Polícia local ou afrontar as autoridades;


9. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que o guia da manifestação que empunhava a única catana foi o primeiro a ser atingido com tiro num dos membros inferiores; na sequência, um oficial das Forças Armadas vendo-o estatelado no chão, aproximou-se com petulância, o que originou a revolta num último esforço do ferido para a reacção com o golpe de catana;


10. A delegação do grupo parlamentar da UNITA apurou e constatou que, as forças de Defesa e Segurança massacraram mesmo de forma bárbara, hedionda e fria, vinte e três (23), cidadãos angolanos, devidamente identificados mais cinco (5) com apenas um nome, num total de vinte e oito(28) no dia 30 de Janeiro de 2021. Tendo em posse todos os dados, em defesa do Estado Democrático e de Direito o Grupo Parlamentar da UNITA predispõem-se a partilhá-los com as Autoridades Judiciais.


11. A delegação do grupo parlamentar da UNITA apurou que as forças de Defesa e Segurança provocaram dezoito (18) feridos com armas de fogo e desse número, sete (7) encontram-se a fazer tratamento tradicional por receio de serem mortos, caso se apresentem a um hospital para tratamento convencional.
12. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que, as forças de defesa e segurança para além do massacre cometido, também, profanaram e ocultaram os cadáveres dos cidadãos fuzilados a tiro;


13. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que a maioria dos cadáveres foi atirada ao rio Cuango, ravinas e outros enterrados em locais inóspitos.


14. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que para além dos discursos musculados e não conciliadores, no terreno, as Forças de Defesa e Segurança continuam com as acções de hostilidade e perseguição aos activistas cívicos e membros do protectorado. Nesta sequência, cerca das 18h.33 do dia 08 de Fevereiro do corrente ano, registou-se mais um assassinato de um cidadão e o ferimento com gravidade de um outro na rua da Negola, Bairro Balabala, Vila de Cafunfo.


15. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA apurou que quanto ao material bélico e armas brancas exibidas pela Polícia Nacional local, o mesmo não corresponde com a verdade, pois não pertencem aos cidadãos manifestantes.


16. A delegação do Grupo Parlamentar da UNITA não apurou o envolvimento de cidadãos Congoleses na manifestação.


Conclusões


Face as constatações no terreno a delegação de Deputados do Grupo Parlamentar da UNITA alerta a opinião pública Nacional e Internacional e conclui o seguinte:

1. Considerando a miséria extrema que assola as populações daquela região do país; atendendo as acções de hostilidade das Forças de Defesa e Segurança contra cidadãos indefesos; olhando para o clima de terror instalado, bem como a frustração exaustiva da juventude naquele espaço geográfico; atendendo aos conflitos espalhados nas regiões austral e central de África das quais Angola é parte, aliada a densa fronteira vulnerável com a República Democrática do Congo, cujos conflitos são permanentes, vimos por este, alertar para a gravidade da situação pois poder-se-ão criar condições favoráveis para a penetração de grupos extremistas e oportunistas pelo que o Grupo Parlamentar da UNITA, apela ao diálogo e resolução Pacifica das reivindicações sociais dos cidadãos.

2. O Grupo Parlamentar da UNITA denuncia e condena a censura dos órgãos de comunicação social públicos, com particular destaque para a TPA e a TV Zimbo que têm omitido deliberadamente as versões de outros actores políticos e sociais sobre o massacre de Cafunfo, apesar de terem participado da cobertura das conferências de imprensa do Presidente da UNITA e do seu Grupo Parlamentar sobre a matéria. Em contravenção ao estatuído na Constituição da República e na Lei, não obedeceram ao contraditório, envolvendo-se na campanha de intoxicação levada a cabo pelo Executivo e o partido que o sustenta.

Recomendações

1. O Grupo Parlamentar da UNITA insta o Executivo Angolano no sentido de restabelecer com urgência o clima de paz, tranquilidade e harmonia social com todo o povo da região e em particular o do Município do Cuango;


1. O Grupo Parlamentar da UNITA exige que seja revertido o quadro calamitoso derivado dos acontecimentos recentes na Vila do Cafunfo e que haja o compromisso para que situações de género nunca mais voltem a acontecer


2. O Grupo Parlamentar da UNITA exige que sejam responsabilizados política, disciplinar e criminalmente, todos aqueles que investidos de responsabilidades do Estado participaram do massacre da população indefesa;


3. O Grupo Parlamentar da UNITA insta o Executivo Angolano no sentido de mitigar a grave situação social e económica daquela região do País;


4. O Grupo Parlamentar da UNITA alerta a Sua Excelência o Presidente da República a tomar muita atenção das informações dos seus auxiliares e não se deixar manipular e condicionar pelos mesmos.


5. O Grupo Parlamentar da UNITA apela a racionalidade e a responsabilidade de todos os titulares de cargos públicos e em particular os da esfera de Defesa e Segurança no conteúdo e no tom dos discursos que transmitem aos cidadãos.


6. O Grupo Parlamentar da UNITA agradece o apoio e a solidariedade de todos aqueles que directa ou indirectamente contribuíram para o êxito da missão parlamentar ao Município do Cuango.


Luanda, 10 de Fevereiro de 2021. –
A Delegação do Grupo Parlamentar da UNITA ao Cuango


Lista dos mortos do massacre de Cafunfo - 30 Janeiro 2021
1. Zango Zeca Muandjaji
2. António Avelino Bumba
3. Jorge Justino Muawanda
4. Tchifutchi Tomás
5. André Tchinjanga
6. Mutunda Mambo
7. Raimundo Manuel
8. André Muene Kapango
9. Borge Angelino
10. Castro Cassombo
11. Juca Avelino
12. David Mbalu Muamugina
13. Mukuenda Tomás Luampishi
14. Júlio Elias
15. Adacar Kaita
16. José Kawambiye
17. Sheta Eduardo
18. Nelson João Kapoia
19. Manuel Swete
20. Dinis Simba
21. Joel Julinho Lázaro
22. Afonso Sazeca
23. Zito Zeca Muchima
24. Muyemba
25. Muteba
26. Alfredo
27. Kaxala
28. Wilson

 

 



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