Luanda - As imunidades que protegem o ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, de processos judiciais vão ser reavaliadas pela Procuradoria-Geral da República de Angola (PGA), avançou à Lusa uma fonte judicial.
Fonte: Lusa
Até agora, o ex-vice-Presidente do país e antigo dirigente da petrolífera estatal Sonangol, cujo nome tem surgido envolvido em vários escândalos de corrupção tem estado a salvo das investigações criminais, com base na Constituição angolana que concede uma imunidade aos antigos titulares deste cargo, que só terminaria cinco anos após o fim do mandato, em setembro de 2022.
Mas, segundo uma fonte judicial ouvida pela Lusa, a PGR vai pedir uma reavaliação jurídica do estatuto do vice-presidente “para analisar a situação e ver até que ponto está protegido ou não”.
No entendimento de alguns juristas, como Rui Verde, a PGR angolana tem feito uma “interpretação errada da Constituição” no que se refere às imunidades de ex-titulares do poder público.
Os cinco anos só contariam se se quisesse abrir um processo no tempo em que ele [Manuel Vicente] era vice-Presidente”, o que não acontece em relação às alegações que têm sido noticiadas pela imprensa, disse o jurista à Lusa no passado mês de outubro.
O nome do antigo presidente da petrolífera angolana Manuel Vicente, que foi investigado em Portugal, surge ligado à empresa CIF (China International Fund) e ao desvio de milhões de dólares da Sonangol.
Segundo Rui Verde, a imunidade que está estabelecida no artigo 127.º da Constituição da República de Angola (responsabilidade criminal) aplica-se apenas a crimes praticados no exercício das funções. “Neste momento, não estamos a falar de Presidente e vice-Presidente, e sim de ex-Presidente [José Eduardo dos Santos] e ex-vice Presidente [Manuel Vicente] e aí não se aplica este artigo 127.º. Julgo que tem havido alguma confusão neste aspeto”, destacou na altura o jurista e professor de Direito.
No mês passado, analistas da consultora Eurasia consideraram que a crise económica e o crescente descontentamento popular em Angola iriam forçar o Governo a aprofundar a luta contra a corrupção, atingindo nomeadamente o antigo vice-Presidente.
Os analistas escreveram, numa nota enviada aos clientes a que a Lusa teve acesso, que o presidente João Lourenço, pressionado para investigar o ex-governante e seu conselheiro para a área petrolífera, Manuel Vicente, poderá usar a mesma estratégia que usou para revogar a imunidade do antigo ministro Manuel Rabelais, que vai começar a ser julgado no dia 09 de dezembro.
“A perda de imunidade de Manuel Rabelais abre a porta para Lourenço visar Manuel Vicente, antigo vice-Presidente de Angola e presidente da Sonangol entre 2012 e 2017”, apontavam, lembrando que o antigo governante “escapou até agora às perseguições por aconselhar Lourenço sobre os meandros da rede de compadrio de José Eduardo dos Santos e por ajudar na reforma do setor petrolífero”.
“Continuar a proteger Manuel Vicente pode ser um risco político demasiado grande”, já que o antigo líder da Sonangol já está a ser investigado pelas instâncias judiciais pelo seu papel num dos maiores esquemas de corrupção da era do antigo chefe de Estado, o China International Fund (CIF)”, concluem os analistas da Eurásia.
Manuel Vicente, que é atualmente deputado (MPLA) encontra-se a residir no Dubai desde junho, invocando motivos de saúde, ausência que foi comunicada à Assembleia Nacional e que se encontra justificada, segundo uma fonte parlamentar.
A mesma fonte acrescentou que Manuel Vicente tem participado nas sessões plenárias através de videoconferência.
A justiça angolana tem vindo a apertar o cerco aos aliados do anterior Presidente, José Eduardo dos Santos, e constituiu arguidos, em outubro, os generais Manuel Hélder Vieira Dias Júnior, “Kopelipa”, e Leopoldino Fragoso do Nascimento, “Dino”, no âmbito de um processo relacionado com contratos entre o Estado e o CIF, através do extinto Gabinete de Reconstrução Nacional.
Os antigos chefes da Casa Militar e da Casa de Segurança de José Eduardo dos Santos, que já tinham visto dois edifícios arrestados em fevereiro deste ano pelo Serviço Nacional de Recuperação de Ativos, entregaram ao Estado angolano em outubro várias fábricas, uma rede de supermercados e edifícios de habitação.
Atualmente, os dois homens fortes do anterior regime estão proibidos de se ausentar do país.
A televisão pública angolana (TPA) começou na semana passada, pela primeira vez, a noticiar os casos de corrupção, numa série de reportagens a que deu o nome de “O Banquete”.
Manuel Vicente é um dos nomes que faz parte do "grupo restrito de angolanos”, que inclui outros dirigentes do MPLA, que “utilizando influências, levaram do país milhares de milhões de dólares", desviando fundos públicos através de contratos milionários com empresas de que eram beneficiários, segundo os analistas.
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