Luanda - O ativista Dago Nível, que diz ter testemunhado a morte de um manifestante na quarta-feira em Luanda, contrariou a versão médica , e garantiu que o jovem, de 26 anos, foi atingido por uma bala.
Fonte: Lusa
Em declarações à Lusa, Francisco Mapanda, ou Dago Nível, como é mais conhecido, afirmou ter visto o jovem caído no chão, com “o sangue furado” e perda de sangue e massa encefálica.
O médico Augusto Manuel disse esta quinta-feira à televisão pública TPA que o jovem universitário, Inocêncio de Matos, de 26 anos, morreu devido a ferimentos na cabeça provocados por um “objeto contundente” que pode ter sido “um pau, um pedaço de metal, de ferro ”, rejeitando a versão de ter sido atingido por disparo de arma de fogo.
Na quarta-feira, dia em que a polícia angolana frustrou uma tentativa de manifestação em Luanda que resultou em vários confrontos com jovens, relatos e vídeos postos a circular nas redes sociais apontavam para a existência de uma morte, que foi negada no mesmo dia à noite pelas autoridades.
Dago Nível disse à Lusa que se encontrava com Inocêncio de Matos “Beto”, num grupo que saiu do bairro Rangel e tentou acessar ao centro da cidade, em direção ao Largo 1.º de Maio, onde se previa que terminasse a manifestação, tendo passado várias barreiras policiais.
“O 'Beto' tombou na barreira, onde a polícia fez tiros”, contou com Dago Nível, explicando que conheceu o estudante determinado mesmo dia. “Eu não conhecia pessoal o jovem, foi o meu primeiro contacto e infelizmente o único”, afirmou o ativista, contribuindo que “Beto” enfrentou a polícia “destemidamente e com bravura” .
Segundo o ativista, a polícia tentou impedir o acesso dos manifestantes à estrada principal de várias formas, fazendo disparos e lançando gás lacrimogéneo para dispersar os jovens, que foram avançando e passando como barreiras policiais.
Na quarta barreira, entre a Cidadela e o hospital Américo Boavida, quando avançavam para a Avenida Brasil, a polícia terá feito mais disparos para intimidar e conter o avanço dos jovens que se ajoelharam e cantaram o hino como forma de dissuasão.
“Éramos muitos e não tinha como nos parar, elaborou a fazer tiros para o ar e para o chão e nós ajoelhámos e levantámos as mãos como forma de inibir a polícia e começámos a cantar o hino”, relatou Dago Nível, dizendo que “Beto ”Se encontrava na primeira fila, com outros jovens, ajoelhado.
“Continuaram a atirar e uma das balas entrou na cabeça do 'Beto'”, continuado Dago Nível, acusando o médico de “estar a inventar uma história”. O ativista acrescentou que “Beto” não caiu quando estava a correr , e sim quando estava ajoelhado.
Depois o jovem caiu, as pessoas cercaram e formar a gritar: mataram, mataram. Eu fiquei transtornado, vi um buraco na cabeça, vi bocados do cérebro, percebi que estava morto ”, testemunhou.
“Um dos 'manos' sobre o corpo, mas a polícia não queria que nós levássemos o corpo, foram eles que levaram”, assegurou.
Os jovens devem então fugido e entrado no bairro para escapar à polícia e “não haver mais ocorrido mortais, tendo sido cercados e permanecido no local durante algum tempo”.
“Foi a primeira vez que vi isto acontecer. Nem o José Eduardo dos Santos fez isso ”, lamentou o ativista, criticando a repressão do protesto, que visava reivindicar melhores condições de vida e mudança autárquicas , por parte do Presidente João Lourenço“ que se propôs a mudar o que está mal ”e em que os jovens depositaram “algum crédito”.
“É repugnante, estou muito transtornado”, desabafou.
Dago Nível é um ativista ligado ao caso 15 + 2 que foi condenado e preso por gritar no tribunal de Luanda que o julgamento era “uma palhaçada”. O processo 15 + 2 é relativo a 17 jovens ativistas contestatários da governação em Angola, que foram presos em 2015 quando debatiam um livro e acusados de prepararem um golpe de Estado contra o Governo do MPLA do então presidente, José Eduardo dos Santos.
Entre estes, encontrava-se ou rapper Luaty Beirão (“Iconoclasta”) que também foram incluídos na ordem de detenção na quarta-feira, tendo sido libertado algumas horas mais tarde. Dago Nível é atualmente um dos impulsionadores da Biblioteca 10Padronizada, uma biblioteca de rua improvisada debaixo de uma via pedonal em Luanda que oferece leitura grátis.
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