Luanda - O coordenador do Observatório Político e Social de Angola (OPSA), Sérgio Calundungo, afirmou hoje que as autoridades angolanas não parecem interessadas em investigar os incidentes em Cafunfo e defendeu que o Presidente angolano se deve pronunciar sobre o caso.
Fonte: Lusa
Em declarações à Lusa sobre os acontecimentos de final de janeiro na vila mineira da Lunda Norte, em que várias pessoas morreram e ficaram feridas, o também analista político defende uma investigação independente.
“Há uma prática continuada de não fazer recurso a investigação independente quando esses casos acontecem”, afirmou, lembrando que não é a primeira vez que incidentes envolvendo polícia e cidadãos ocorrem em Angola.
Sérgio Calundungo defende o recurso à Procuradoria-Geral da República, ao ministro da Justiça e Direitos Humanos e à própria Assembleia Nacional – entidades com um nível de equidistância suficientes e que poderiam contar com o apoio de organizações da sociedade civil “que têm experiência na investigação deste tipo de casos”.
Sobre o impedimento da delegação que integrava cinco deputados da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), bem como a ativista Laura Macedo, entrarem em Cafunfo, considerou que não faz sentido impedir a circulação de qualquer cidadão, seja ou não deputado.
“A livre circulação de pessoas e bens nunca deveria ser questionada em nenhuma circunstância”, assinalou, afirmando que os deputados têm legitimidade para ir onde quiserem para tentar apurar o que aconteceu.
“O que me parece estranho é que esta não tenha sido uma iniciativa da própria Assembleia Nacional, ou seja, eu fico com a sensação de que as autoridades angolanas não estão a mostrar muita vontade de fazer uma investigação independente”, adiantou o analista.
As razões pelas quais assim se procede podem estar sujeitas a especulações, prosseguiu, considerando que esta atitude “aumenta as suspeitas de que, se calhar, não há interesse em que se investigue”.
Questionado sobre algumas críticas que têm sido dirigidas ao Presidente da República por não se pronunciar sobre o tema, o responsável da OPSA disse que João Lourenço “é o presidente de todos os angolanos” e quando acontecem incidentes “que chocam toda a nação seria expectável” que falasse, até pelos seus efeitos sobre os responsáveis dos órgãos auxiliares da presidência.
Neste âmbito, deu como exemplo as declarações de João Lourenço sobre a detenção de jornalistas durante uma manifestação em Luanda, que tiveram um “papel de salvaguarda desse tipo de ações”.
“Num país onde a concentração de poderes é grande, o facto de o titular do poder executivo se vir pronunciar teria um efeito muito positivo” para “ajudar a serenar os ânimos” e “clarificar qual é a posição oficial das autoridades”, sublinhou.
Sérgio Calundugo apontou ainda a divergência entre os discursos do comandante da Polícia Nacional e do ministro do Interior, “com um tom muito elevado”, numa primeira fase, em contraste com o discurso “de tom firme, mas mais conciliador” do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos.
“Fazendo eles todos parte do mesmo Governo, não sabemos qual é a posição oficial e, se calhar, o Presidente poderia clarificar esta situação”, observou o analista.
Segundo o analista, “é preciso que as pessoas percebam porque é que morreram pessoas em circunstâncias como estas”. “Eu sei que há muitos apelos à calma, à serenidade e diálogo, mas, por favor, não se deve deixar de apelar com a mesma veemência à ideia de que este crime, caso tenha havido crime, não passe impune”, apelou.
“Há quem diga que foi um assassínio da polícia, há outros que dizem que foi um ato de rebelião. Entre estas duas partes está a verdade e deve ser procurada, os angolanos merecem saber a verdade, quanto mais não seja para que não se voltem a repetir tais atos”, sugeriu.
Em 30 de janeiro, segundo a polícia angolana, cerca de 300 pessoas ligadas ao Movimento do Protetorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT), que há anos defende a autonomia daquela região, tentaram invadir uma esquadra policial, obrigando as forças de ordem a defender-se, provocando seis mortes,
A versão policial é contrariada pelos dirigentes do MPPLT, partidos políticos na oposição e sociedade civil local, que falam pelo menos 25 mortos e alegam que se tratou de uma tentativa de manifestação, previamente comunicada às autoridades, e que os manifestantes estavam desarmados.
O Movimento Protetorado da Lunda Tchokwe luta pela autonomia da região das Lundas, no Leste-Norte de Angola.
A autonomia da região das Lundas (Lunda Norte e Lunda Sul, no leste angolano), rica em diamantes, é reivindicada por este movimento que se baseia num Acordo de Protetorado celebrado entre nativos Lunda-Tchokwe e Portugal nos anos 1885 e 1894, que daria ao território um estatuto internacionalmente reconhecido.
Portugal teria ignorado a condição do reino quando negociou a independência de Angola entre 1974/1975 apenas com os movimentos de libertação, segundo o movimento.
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